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HÍMEROS è um Colóquio sul-americano sobre essa temática, com 40 trabalhos já confirmados, exposição de pôsteres e vídeos, que serão selecionados, e a pré-estreia de "O ATO" - variações freudianas 2, pela Cia. Inconsciente em Cena. Confira os Palestrantes confirmados com os títulos de suas comunicações em 'PROGRAMAÇÃO'.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

ARTES PLÁSTICAS EM LACAN



  LEONARDO DAVINCI
  “Vocês sabem, o fato de  que a sublimação é uma tendência que incide sobre objetos que não são os objetos primitivos, mas os objetos mais elevados do que é oferecido à consideração humana e inter-humana, Freud só acrescentou mais tarde algumas complementações, mostrando o papel que podia desempenhar a sublimação na instauração dos interesses do eu.
Este termo, sublimação, foi desde então retomado por um certo número de autores da comunidade psicanalítica, que o ligam à noção de neutralização, de desinstintualização do instinto.Devo dizer que aí está algo de muito difícil de conceber: uma deslibidinação da libido, uma desagressivação da agressividade. Eis os termos mais amáveis que vemos, mais correntemente, florescer sob a pena de Hartmann e Loewenstein. Praticamente, não nos esclarecem sobre o mecanismo da sublimação.
O interesse de um estudo como o de Leonardo da Vinci por Freud é que nós podemos, ali, tomar algumas idéias, pelo menos  iniciar uma reflexão que nos pode permitir fazer repousar o termo sublimação sobre uma base mais estruturada que a noção de um instinto que se desinstintualiza, até mesmo de um objeto que, como se diz, se torna mais sublime: pois pareceria, ao acompanhar nossos psicólogos do ego, que seja o Stuff   da sublimação”. (Lacan, 1956-57, Sem. 4, p. 442)
                                                       
“Leonardo Da Vinci foi ele próprio objeto de uma idealização, senão de uma sublimação, que começou durante sua vida, e que tende a fazer dele uma espécie de gênio universal e, além disso, precursor espantoso do pensamento moderno. Isso é o que sustentam alguns, e mesmo críticos muitos eruditos, que começaram – como Freud, alias – a deslindar o problema. Outros fazem o mesmo em planos diversos do da arte. Duhem, por exemplo, diz que Leonardo da Vinci havia entrevisto a lei da queda dos corpos, ou mesmo o princípio da inércia. Um exame um pouco rigoroso do ponto de vista da história das ciências mostra que não é nada disso, Todavia, é claro que Leonardo da Vinci fez descobertas surpreendentes, e que os desenhos que ele nos deixa na ordem da cinemática, da dinâmica, da mecânica,da balística, dão conta, com freqüência, de uma percepção extraordinariamente  pertinente, muito à frente de seu tempo, o que não nos permite de modo algum acreditar que não houvesse, em todos estes planos, trabalhos já muito adiantados na matematização,especialmente, por exemplo, da cinemática.”   (p. 443)

“Parece vir à idéia que, correlativamente a toda sublimação,isto é, ao processo de dessubjetivação ou de naturalização do Outro que constituiria seu fenômeno essencial, vê-s sempre se produzir, no nível do imaginário, sob ma forma mais ou menos acentuada conforme a maior ou menor perfeição desta sublimação, uma inversão das relações entre o eu e o outro.
 Teríamos realmente, assim, no caso de Leonardo da Vinci, alguém que se dirige e comanda a si mesmo a partir de seu outro imaginário. Sua escrita em seu espelho estaria ligada,pura e simplesmente, à sua própria posição diante de si mesmo. Teríamos aqui o mesmo tipo de alienação radical daquela sobre a qual concluí meu último seminário a propósito da amnésia do pequeno Hans.
Estas era, então, uma questão que eu formulava. É também com uma questão que vou terminar hoje: a de saber se o processo que chamamos de sublimação, ou psicologização, ou alienação, ou egotização, não comporta, em sua própria direção, uma dimensão correlata, aquela pela qual o ser esquece a si mesmo como objeto imaginário do outro.
Com efeito, existe para o ser uma possibilidade fundamental de esquecimento no eu (moi) imaginário”.  (p.450)
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HOLBEIN

“Vou agora fazer circular entre vocês algo que data de uma centena de anos antes, 1533, uma reprodução de um quadro que, penso, todos vocês conhecem – Os Embaixadores, pintado por Hans Holbein. Os que o conhecem poderão rememorá-lo  pela reprodução. Os que não o conhecem deverão considerá-lo com atenção. Voltarei a isto daqui a pouco”. (Lacan, 1964-65, p.85)


“No quadro de Holbein, logo lhes mostrei – sem mais dissimular, do que tenho hábito de fazer, a outra face das cartas – o singular objeto flutuando no primeiro no primeiro plano, que está lá para olhar, para pegar, quase diria, para pegar na armadilha, aquele que olha,  quer dizer, nós. É, em suma, um modo manifesto, sem dúvida excepcional e devido a não sei que momento de reflexão do pintor, de nos mostrar que, enquanto sujeito, estamos para dentro do quadro literalmente chamados, e aqui representados como pegos. Pois o segredo desse quadro, de que lhes lembrei as ressonâncias, o parentesco com as vanitas, desse quadro fascinante por apresentar, entre dois personagens paramentados e fixados, tudo que relembra, na perspectiva da época, a vaidade das artes e das ciências – o segredo desse quadro é dado no momento em que, afastando-nos ligeiramente dele, pouco a pouco, para a esquerda, e depois nos voltando, vemos o que significa o objeto flutuante mágico. Ele nos reflete nosso próprio nada, na figura do crânio de caveira. Utilização, portanto, da dimensão geometral da visão para cativar o sujeito, relação evidente ao desejo que, no entanto, resta enigmático”. (p.91)


“A função do quadro – em relação àquele a quem o pintor, literalmente dá a ver seu quadro – tem uma relação com o olhar. Essa relação não é, como pareceria à primeira vista, de ser armadilha de olhar. Poderíamos crer que, como o ator, o pintor visa ao você-me-viu, e deseja ser olhado. Não creio nisto. Creio que há uma relação ao olhar do aficionado, mas que é mais complexa. O pintor, àquele que deverá estar diante de seu quadro, oferece algo que em toda parte, pelo menos, da pintura, poderia resumir-se assim – Queres olhar? Pois bem, veja então isso! Ele oferece algo como pastagem para o olho, mas convida aquele a quem o quadro é apresentado a depor ali o seu olhar, como se depõem as armas. Aí está o efeito pacificador, apolíneo, da pintura. Algo é dado não tanto ao olhar quanto ao olho, algo que comporta abandono, deposição do olhar.(p.99)


“O que é que nos seduz e nos satisfaz no trompe-l’oeil? Quando é que ele nos cativa e nos põe em jubilação? No momento em que, por um simples desdobramento de nosso olhar, podemos nos dar conta de que a representação não se move com ele, e que ali há apenas trompe-l’oeil. Pois nesse momento ele aparece como sendo coisa diferente daquilo pelo que ele se dava, ou melhor, ele se dá agora como sendo essa outra coisa. O quadro não rivaliza com a aparência, ele rivaliza com o que Platão nos designa mais além da aparência como sendo a Ideia. É porque o quadro é essa aparência que diz que ela é o que dá aparência, que Platão se insurge contra a pintura como contra uma atividade rival da sua.(p.109)
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MUNCH

“Para aqueles que hesitariam, encarno o que quero dizer – penso na pintura de um Munch, de um James Ensor, de um Kubin, ou ainda nessa pintura que, curiosamente, poderíamos situar de maneira geográfica como tendo sede no que em nossos dias se concentra da pintura de Paris. Em que dia veremos serem forçados os limites desta sede? – é mesmo, se acredito no pintor André Masson com quem falava disso recentemente, a questão mais atual. Pois bem, indicar referências como essas, não é de modo algum entrar no jogo histórico, movente, da crítica, a qual tenta sacar qual seja a função da pintura num dado momento, em tal autor ou em tal tempo. Para mim, é no princípio radical da função dessa bela-arte que tendo me colocar. (p. 107)
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CÉZANNE

“Sublinho primeiro que foi partindo da pintura que Maurice Merleau-Ponty foi mais especialmente levado a inverter a relação que, desde sempre, foi feita pelo pensamento, entre o olho e o espírito. Que a função do pintor é coisa completamente diferente da organização do campo da representação em que o filósofo nos mantinha em nosso estatuto de sujeito, é isto que ele demarcou admiravelmente partindo do que chama, com o próprio Cézanne, esses azuizinhos, esses marronzinhos, esses branquinhos, esses toques que chovem do pincel do pintor”. ( p.107)
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CARAVAGGIO

“[falta página 108] ... vamos que o sucesso de tal empresa não implica em nada de as uvas serem admiravelmente reproduzidas, tal como as que podemos ver na cesta que segura o Baco de Caravaggio, nos Uffizzi. Se as uvas fossem assim, é pouco provável que os pássaros se tivessem enganado, pois por que veriam os pássaros uvas nesse estilo que força as coisas? Deve haver ali algo de mais reduzido, de mais próximo do signo, no que pode constituir para os pássaros a uva como sua presa. Mas o exemplo oposto de Parrasios torna claro que ao querer enganar um homem, o que lhe apresentamos é a pintura de uma cortina, quer dizer, de algo mais além do qual ele quer ver”.(p.109)
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MATISSE 

“Voltamos agora aos azuizinhos, branquinhos, marronzinhos de Cézanne, ou ainda ao que Maurice Merleau-Ponty de modo tão bonito põe como exemplo numa passagem de Signos, a essa estranheza do filme em câmera lenta onde se vê Matisse pintando. O importante é que o próprio Matisse ficou baratinado com o filme. Maurice Merleau-Ponty sublinha o para (p.110)
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VAN GOGH

“Era preciso nada menos do que uma experiência onde fosse tão intensamente reunida a universalidade que comporta o que é próprio aos sapatos no universitário, com o que podia apresentar de absolutamente particular a pessoa do professor D, para que eu possa convidá-los simplesmente a pensar agora nos velhos sapatos de Van Gogh, dos quais Heidegger nos deu a imagem maravilhante do que é uma obra de beleza.
É preciso que imaginem as botinas do professor D ohne Begriff, sem a concepção do universitário, sem relação alguma com sua personalidade tão atraente, para que vocês comecem a ver as botinas de Van Gogh viverem, adquirirem vida em sua incomensurável qualidade de belo”.
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SALVADOR DALI:
“Para produzir agora, numa retrospectiva, os trabalhos de nossa entrada na psicanálise, relembraremos por onde essa entrada se fez.
 Médico e psiquiatra, havíamos introduzido, sob a rubrica de “conhecimento paranoico”, algumas resultantes de um método clínico de exaustão do qual nossa tese de medicina constituiu um ensaio<!--[if !supportFootnotes]-->[1]<!--[endif]-->.
 Mas do que evocar o grupo (Évolution Psychiatrique) que de bom grado lhes acolheu a exposição, ou o eco que elas tiveram no meio surrealista, onde se reatou um antigo vínculo por uma nova retomada – Dali, Crevel, a paranoia crítica e o Claveci de Diderot, cujos rebentos encontram-se nos primeiros números do Minotaure<!--[if !supportFootnotes]-->[2]<!--[endif]--> -, apontaremos a origem desse interesse.” (LACAN, 1998, Escritos, p.69)